sábado, 27 de fevereiro de 2010

HOSPITALIDADE: A PEDAGOGIA DO OUTRO


A hospitalidade se define sempre a favor do outro. É um movimento na direção do outro, uma poesia da acolhida. Uma alta funcionária do governo do Peru, que fora antes assistente social em regiões de indígenas amazônicos, ao visitar uma comunidade da nação Achuar, foi recebida com esta canção de hospitalidade: “Pomba, que deixaste teu ninho e que vens de tão longe, não fiques triste. Nossa comunidade é uma grande árvore que abre seus ramos e te acolhe em seu ninho. Pomba fique conosco”.
A hospitalidade é definida na Bíblia como um dom (I Pe. 4. 9). Abraão teve uma experiência linda de hospitalidade (Gn. 18. 1-16). O escritor da epístola aos Hebreus chega a afirmar: “Não vos esqueçais da hospitalidade, pois por ela alguns, sem o saber, hospedaram anjos” (Hb. 13. 2). O apóstolo Paulo, escrevendo a Timóteo (I Tm. 3. 2), afirma: “É necessário, pois, que o bispo seja [...] hospitaleiro...” (grifo meu). A acolhida traz à luz a estrutura básica do ser humano. Existimos porque fomos acolhidos: a generosidade da mãe, o colo do pai, a companhia dos amigos, etc. Tudo isso são imagens da hospitalidade em nossa vida diária.

Abraão e as dimensões da hospitalidade (Gn. 18.1-16)

A questão do olhar

O texto de Gênesis 18 mostra-nos com profundidade, as dimensões e a beleza da hospitalidade. Logo no versículo 2, há uma proposital repetição do verbo ver! O versículo diz: “Levantou Abraão os olhos, olhou e viu três homens em pé na sua frente. Vendo-os, correu da porta da tenda ao seu encontro, e prostrou-se em terra”. Ora, se o texto afirma claramente que os três homens estavam “em pé na sua frente”, dá para presumir que Abraão os teria visto, não? Mas o texto faz questão de frisar que ele, com certeza, viu, olhou, atentou para eles.
O que isso tem de tão importante? Isso nos assegura a base da hospitalidade: a questão do olhar! O olhar sempre representa um conhecimento da presença do outro, e, por parte do estranho, do que se aproxima pedindo abrigo, uma súplica silenciosa para um possível encontro. Negar-se a olhar é pretender tornar não-existente o que existe e grita. Abraão olhou, viu, aceitou o fato de que o outro carecia de seu auxílio, de sua acolhida!

A questão da sensibilidade

Sem a sensibilidade não há movimento de ida ao encontro do outro. Não há socorro, não há celebração. Há um termo grego que traz as mais belas dimensões da sensibilidade: patós (sentimento). Quando a sensibilidade está aflorada em nós, o patós subjuga o lógos (razão, lógica). O sentimento domina a lógica. Abraão não raciocina no sentido de que aqueles homens fossem estranhos, e, portanto representassem uma ameaça, mas parte do patós, com seu ato de “prostrar-se em terra”. Somente os sensíveis podem acolher. O mundo embrutecido não permite que a veia da sensibilidade nos guie para além das garras da lógica.

A questão da acolhida

A acolhida não é feita apenas da verbalização do encontro, mas de gestos que se concretizam na história:
Convite para o descanso: no versículo 4, Abraão diz: “...repousai debaixo dessa árvore”. A promoção do descanso é gesto de humanidade que enxerga no outro a necessidade de recobrar o ânimo. O gesto de oferecer a sombra de uma árvore é o símbolo do enxergar da necessidade de uma brisa, de uma refrigeração do calor da vida.
Oferecer água fresca: essa água aponta para o gesto de oferecer vida. Água é vida! No versículo 4, Abraão diz: “traga-se agora um pouco de água, e lavai os pés”. Lavar os pés é o supremo grau de acolhida e serviço. É um indicativo de que a convivência generosa e aberta é livre da poeira do passado.
Convite para comer: a hospitalidade e a convivência se concretizam na comensalidade. No versículo 5, Abraão diz: “Trazei um bocado de pão”. Nos versículos 6, 7 e 8, a refeição se amplia. No âmbito da hospitalidade não se trata apenas de uma nutrição, mas é a consumação de uma relação e de uma convivência. É compartilhar do que você come todos os dias, ou seja, é um convite à sua vida diária!
Servir de forma abundante: uma refeição especial, não um serviço burocrático de um cotidiano cansativo. Abraão oferece o melhor: no versículo 7, o texto faz questão de frisar que o bezerro era “tenro e bom”. É a máxima descentralização de si mesmo e a máxima concentração no outro.
A base maior da hospitalidade é o reconhecimento do outro. O Novo Testamento afirma que o próprio Deus por sua encarnação se fez outro em Jesus. É no outro, portanto, que encontramos a máxima densidade da presença de Deus. Isso é hospitalidade.
“Se vivermos justapostos acabaremos opostos, por isso, precisamos sempre ser compostos, entrando em alguma composição para conviver, absolutamente juntos” (Martin Buber, filósofo judeu-alemão, em “Eu-tu, por uma democracia sócio-cósmica”).

Alan Brizotti
www.genizahvirtual.com

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

COMO GRÃO DE MOSTARDA


Nos Evangelhos, encontramos Jesus falando sobre a fé que promove milagres.
"Pois em verdade vos digo que, se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte: Passa daqui para acolá, e ele passará. Nada vos será impossível" (Mt 17.20).
Mas como podemos entender essa “fé como grão de mostarda”?
Primeiramente, imaginamos uma fé grandiosa, mas já sabemos que não é, pois o grão de mostarda era uma semente minúscula. Também não se trata apenas de ter uma pequena fé, pois no mesmo episódio Jesus havia repreendido seus discípulos por sua pouca fé.
Creio que o Senhor não se referia somente ao tamanho da fé; seu discurso era mais abrangente. Jesus subentendeu ali a qualidade, o tipo de fé – “como um grão de mostarda” e não "do tamanho de um grão de mostarda".
A semente de mostarda, embora muito pequena, num curto período de tempo transformava-se num arbusto cheio de galhos. Mesmo insignificante, o seu resultado era notável, reconhecido por todos.
O grão de mostarda possuía, em si mesmo, o potencial de produzir uma grande planta.
Da mesma forma deve ser a nossa fé. Por menor que seja, se for uma fé provinda de Deus e colocada em Deus, produzirá frutos evidentes. A fé, tal qual o grão, possui no seu âmago o poder transformador, a condição de produzir muito além do que se pode imaginar.
Essa fé não se apoia em nada humano, seja sentimento, percepção ou inteligência. Não necessita de esforço próprio, mas é a fé simples, ativa e producente, fundamentada em Jesus.
Aprendemos que é necessário "desenvolver a fé"; isso nada mais é do que viver o Evangelho, aperfeiçoar o caráter de Cristo em nós.
Não precisamos de uma medida específica de fé para promover milagres. Mais importante do que o tamanho da fé é o seu alicerce, Jesus, e as ações produzidas naturalmente através dela. O próprio Senhor afirmou: "Na verdade, na verdade vos digo que aquele que crê em mim também fará as obras que eu faço, e as fará maiores do que estas..." (Jo 14.12).

Rosane Itaborai Moreira

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

DIZIMAR COM ALEGRIA


O dízimo é um tema que vem sendo deturpado ao longo da História.
Transformado de contribuição voluntária em obrigação desde que a igreja se ligou ao Estado, passou a ser meio de manipulação pelos líderes e motivo de críticas e piadas, confundindo o cristão sincero.
Mas, independente dos erros e absurdos, frutos de ganância e abuso de poder, é necessário entender que a igreja não sobrevive de forma organizada sem contar sistematicamente com a contribuição dos membros. Ela não pode servir se não possuir uma estrutura adequada.
Os ensinamentos bíblicos sobre contribuição financeira voluntária mostram que os cristãos são livres para ofertar ou não ofertar, que valor para Deus importa menos que sinceridade do coração e desejo de contribuir, que não há patamar mínimo exigido, que Deus ama quem dá com alegria.
Nenhum homem hoje tem o direito de estipular para os outros a quantia ou percentual de renda que o cristão deve contribuir. Mas cada um deve pensar e avaliar bem sobre o privilégio e a responsabilidade de ser participante e contribuinte com o trabalho do Senhor.
Uma vez que tudo é melhor na Nova Aliança, seria justo e correto diminuirmos nossas contribuições financeiras? Será que a nossa gratidão não nos torna mais generosos, desejosos que o Evangelho alcance outras vidas?
O cristão não é chamado a barganhar com Deus, a dar pensando em quanto Ele multiplicará sua vida financeira. O cristão é chamado a se relacionar intimamente com seu Pai, a fazer o melhor para Ele, a serví-Lo com amor e singeleza de coração.
O Senhor não cobra além da possibilidade de cada um. Jesus honrou a viúva pobre ao dizer a Seus discípulos: “Em verdade vos digo que esta viúva pobre depositou no gazofiláceo mais do que fizeram todos os ofertantes. Porque todos eles ofertaram do que lhes sobrava; ela, porém, da sua pobreza, deu tudo quanto possuía, todo o seu sustento” (Mc 12.43,44).
O Deus que nos ama sem exigir sacrifícios é fiel e nos abençoa com muito mais do que pensamos e pedimos, conforme o Seu poder que opera em nós.
Apesar de Deus não habitar em templos feitos por homens, a igreja local é, e deve ser, o ajuntamento do Seu povo, local abençoador de inúmeras vidas, onde se prega e se ensina a viver a Sua Palavra, de onde missionários são enviados para propagar o Evangelho. Local onde se busca alimento espiritual e conselhos sábios. Para alguns, é o único lugar onde encontram os amigos e se divertem.
Assim, investir com alegria na igreja local é investir no Reino de Deus e cumprir o Seu propósito.
Os erros e abusos cometidos por muitos serão julgados por Deus. Aos cristãos, cabe aplicar os critérios bíblicos e o discernimento do Espírito.

Rosane Itaborai Moreira

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

ARTIGO DE ED RENÉ KIVITZ











LIDERANÇA NÃO É PARA QUALQUER UM

O exercício da liderança é um privilégio e uma responsabilidade de poucos. Usando nossa linguagem teológica, as "pessoas dons" (Efésios 4: 11) são sempre em número muito menor do que as "pessoas com dons" (Efésios 4: 12).
As pessoas dons são responsáveis pela eficácia (fazer as coisas certas) e a eficiência (fazer as coisas da maneira certa) da organização. Quando você tem um problema de liderança, você tem um problema de líderes, e não de liderados. Espera-se, portanto, que os líderes sejam líderes, isto é, tenham no mínimo, uma visão clara do futuro para onde conduzem seus liderados, uma sensibilidade aguçada para que este futuro seja fruto dos sonhos e anseios dos liderados e um senso de responsabilidade para com a organização/organismo, pois os líderes não são servos dos liderados, mas servos da visão comum. Servir os liderados é a maneira como os líderes servem à visão, e não sua finalidade essencial.
Diante destas responsabilidades, acredito que ninguém será capaz de exercer satisfatoriamente a função de liderança, sem o desenvolvimento de pelo menos três capacidades.
A capacidade de conviver com a solidão. Líderes são líderes porque enxergam, percebem, sentem, sabem, estão dispostos a sacrifícios, possuem paixão diferenciados em relação aos liderados. Um líder na média dos seus liderados é um liderado que está no lugar errado, a saber, ocupando a posição de líder. Águias não voam em bandos.
A capacidade de tomar decisões impopulares. John Kennedy disse que o segredo do fracasso é "tentar agradar todo mundo". O líder deve sempre tentar construir consenso, mas deve ter coragem para tomar decisões e assumir responsabilidades. Caso contrário, será um "facilitador de discussões", e não um líder de fato.
A capacidade de conviver com críticas. Como se diz no popular, "nem Jesus Cristo agradou todo mundo". Nesse caso, uma vez que o líder se posiciona, assumindo sua responsabilidade de levar todo mundo rumo ao bem comum, certamente contrariará interesses particulares, e conseqüentemente será alvo de palavras duras e imerecidas. Sempre.
Eis as razões porque o exercício da liderança não é para qualquer um.

Ed René Kivitz