quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

O NASCIMENTO DO REI

O nascimento do Rei chegou. O Natal é uma festa de grande alegria. Traz glória a Deus no céu e alegria na terra entre os homens. O anjo disse aos pastores de Belém: “Não temais, porque vos trago novas de grande alegria para todo o povo; é que hoje na cidade de Davi, vos nasceu o Salvador, que é Cristo, o Senhor” (Lc 2.10,11). Os céus de Belém se cobriram de anjos e uma música ecoou desde as alturas: “Glória a Deus nas maiores alturas, e paz na terra entre os homens a quem ele ama” (Lc 2.14). Devemos celebrar o nascimento de Jesus com entusiasmo, com gratidão e com louvor em nossos lábios. O Natal foi planejado na eternidade. Foi prometido no tempo. Anunciado pelos profetas. Cumprido na plenitude dos tempos. Deus entrou em nossa história, encarnou-se, vestiu a nossa pele e calçou as nossas sandálias. Jesus veio ao mundo não apenas para estar ao nosso lado, mas para ser o nosso substituto. O Rei dos reis fez-se servo. Sendo rico, tornou-se pobre. Sendo santíssimo, fez-se pecado. Sendo o autor da vida, morreu em nosso lugar. O nascimento do Rei foi um golpe no orgulho dos poderosos. O Rei dos reis não entrou no mundo vestido das glórias celestiais. Ele não nasceu num palácio, mas numa estrebaria. Não pisou tapetes aveludados, mas andou pelas estradas poeirentas da Palestina. Não usou um cetro de ouro, mas empunhou um cinzel na dura faina de uma carpintaria. Não veio ostentando poder, mas esvaziou-se e tornou-se servo. Não reivindicou seus direitos, mas humilhou-se até a morte e morte de cruz.
O nascimento do Rei aponta-nos para o insondável amor de Deus. Ele nos amou desde toda a eternidade. Deus nos amou não porque merecíamos ser amados. Amou-nos quando éramos fracos, ímpios, pecadores e inimigos. Ele amou-nos sendo nós filhos da ira. Amou-nos e deu-nos seu Filho Unigênito. Deu-o como oferta pelo nosso pecado. Entregou-o para ser cuspido pelos homens e ser pregado numa cruz como nosso substituto.
O nascimento do Rei revela que há uma estreita conexão entre a manjedoura e a cruz. O Rei da glória entrou no mundo como o Cordeiro de Deus. Ele nasceu para morrer. Jesus é o nosso Cordeiro Pascal. Ele foi imolado em nosso lugar. Seu sangue foi vertido para expiar os nossos pecados. É pela sua morte que recebemos vida. É pelo seu sacrifício que somos perdoados, remidos e reconciliados com Deus.
O nascimento do Rei abriu-nos o caminho de volta para Deus. Ele mesmo é o caminho do céu. Ele é a porta da glória. Por meio dele temos livre acesso ao Pai e podemos entrar confiadamente na presença daquele que está assentado no trono. É por meio de Jesus que somos reconciliados com Deus. É por meio de Jesus que recebemos vida em abundância. É por meio de Jesus que somos adotados na família de Deus, somos feitos filhos de Deus, e nos tornamos herdeiros de Deus.
O nascimento do Rei é a festa da vida e da salvação. Precisamos resgatar o verdadeiro sentido do Natal. Precisamos devolver o Natal ao seu verdadeiro dono. Precisamos como os magos do Oriente, ir a Jesus para adorá-lo, depositando a seus pés os nossos melhores tesouros, pois ele é digno de receber toda honra, toda glória e todo o louvor.

Pr. Hernandez Dias Lopes

sábado, 11 de dezembro de 2010

MERITOCRACIA E GRAÇA

A sociedade, em especial o mundo empresarial, está acostumada com a meritocracia, sistema que valoriza o mérito e aptidão para se atingir determinada posição. Esse argumento parece cada vez mais óbvio e justo, já que as distinções não se dão por sexo, raça, riqueza ou posição social e sim, pelo merecimento pessoal.
Na época de Jesus, e também hoje em várias religiões, era necessário fazer muitas obras para se alcançar o Reino de Deus. Além do cumprimento da Lei de Deus, os religiosos da época acrescentavam mais exigências, tornando o mérito fundamental e a salvação quase impossível.
Mas o Senhor veio mudar o sistema religioso. Veio trazer uma novidade que nenhuma outra religião possui: a Graça, qua faz com que todos recebam gratuitamente a vida eterna, declarando-os igualmente não merecedores e dependentes do sacrifício de Cristo.
Em Romanos 3, a Bíblia afirma que homem algum nada fez ou pode fazer para alcançar a misericórdia de Deus. “Mas agora se manifestou sem a lei a justiça de Deus pela fé em Jesus Cristo para todos e sobre todos os que crêem; porque não há diferença. Porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus; sendo justificados gratuitamente pela sua graça, pela redenção que há em Cristo Jesus”. Efésios mostra que ninguém é capaz de ser justificado por si mesmo “porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus. Não vem das obras, para que ninguém se glorie.” (Ef. 2.8,9)
A Graça é um sistema que escandaliza o homem, porque é contrário a tudo o que se está acostumado e deixa-o completamente vulnerável. É exatamente o oposto da meritocracia, que recompensa cada um conforme o merecimento. Confiar em si mesmo é mais fácil do que saber que a própria vida está na dependência de outra pessoa, em especial de Jesus.
O que aos olhos da sociedade é óbvio não é a lógica de Jesus. Deus entendeu o homem e a sua impossibilidade de merecer algo, depositou a sua justiça em Cristo e O enviou ao mundo para dar, gratuitamente, a salvação a cada um. Louvado seja o Senhor, pois Seu imenso amor independe das obras humanas!
John Newton foi um homem que entendeu a Graça de Deus. Traficante de escravos do séc. XVIII, certo dia enfrentou uma imensa tempestade. Ao término do ocorrido, comentou que se sentiu tão frágil e desamparado que concluiu que somente a Graça de Deus poderia salvá-lo naquele momento. Resolveu abandonar o tráfico de escravos e tornou-se cristão, o que o levou a compor o hino Amazing Grace (Graça Maravilhosa), famoso na voz de Elvis Presley. Anos mais tarde, Newton disse: "Minha memória já quase se foi, mas eu recordo duas coisas: Eu sou um grande pecador, Cristo é o meu grande salvador." No túmulo de Newton lê-se: "John Newton, uma vez um infiel e um libertino, um mercador de escravos na África, foi, pela misericórdia de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, perdoado e inspirado a pregar a mesma fé que ele tinha se esforçado muito por destruir".

Rosane Itaborai Moreira

domingo, 28 de novembro de 2010

O ROSTO DE DEUS

Rafael, Michelangelo e vários outros pintores tentaram retratar o rosto de Deus. Foram infelizes. Como mostrar na tela quem nunca foi visto? Com a proximidade do Natal, mais artistas procuram esboçar o que imaginam ser o rosto de Deus.
Ele se parece com uma criança? É o frágil bebê das manjedouras? Talvez; o reino do céu pertence aos pequeninos, aos que mamam. Ao tentar desenhar o mistério, o artista termina com um ídolo.
O rosto de Deus, entretanto, pode ser experimentado nos sem-teto que perambulam pelas ruas e dormem nos viadutos das grandes cidades. Quando Jesus nasceu, a família estava sem moradia certa, não possuía recursos para pagar uma hospedaria e viu-se obrigada a refugiar-se em um estábulo.
O rosto de Deus pode ser percebido em vítimas de preconceito e em injustiçados. Sobre o menino que nasceu em Belém pairou uma dúvida: ele era de fato filho de José? O casal não inventara aquela história toda para se safar de um rolo?
O rosto de Deus se revela nos desprezíveis, nos que foram condenados à margem da história. Quando o menino nasceu, ninguém notou ou escutou o alarido dos anjos. A trombeta que anunciou paz na terra pela boa vontade de Deus passou desapercebida da grande maioria. Apenas um punhado de pastores foi sensível para presenciar o momento mais importante da história.
Qual o rosto de Deus? Ele não se parece com os cartões postais ou com o menino de barro das lapinhas. Deus é igualzinho a Jesus. E Jesus é bem parecido com o vizinho do lado, com a mulher que pede socorro na delegacia do bairro e com a família que chora a morte do filho no corredor do ambulatório.
Não é preciso muito para encontrar Deus, basta um coração de carne, humano.

Soli Deo Gloria.

Ricardo Gondim

sábado, 27 de novembro de 2010

GOSTO DE GENTE

Gosto de gente com a cabeça no lugar, de conteúdo interno, idealismo nos olhos e dois pés no chão da realidade.
Gosto de gente que ri, chora, se emociona com uma simples carta, um telefonema, uma canção suave, um bom filme, um bom livro, um gesto de carinho, um abraço, um afago.
Gente que ama e curte saudades, gosta de amigos, cultiva flores, ama os animais. Admira paisagens, poeira; e escuta.
Gente que tem tempo para sorrir bondade, semear perdão, repartir ternuras, compartilhar vivências e dar espaço para as emoções dentro de si,emoções que fluem naturalmente de dentro de seu ser!
Gente que gosta de fazer as coisas que gosta, sem fugir de compromissos difíceis e inadiáveis, por mais desgastantes que sejam.
Gente que colhe, orienta, se entende, aconselha, busca a verdade e quer sempre aprender, mesmo que seja de uma criança, de um pobre, de um analfabeto.
Gente de coração desarmado, sem ódio e preconceitos baratos.
Com muito amor dentro de si.
Gente que erra e reconhece, cai e se levanta, apanha e assimila os golpes, tirando lições dos erros e fazendo redentoras suas lágrimas e sofrimentos.
Gosto muito de gente assim... e desconfio que é deste tipo de gente que Deus também gosta!

Artur da Távola

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

ARREPENDER-SE É MUDAR O MUNDO

O arco da narrativa de Lucas, que se alça no evangelho que traz o seu nome e se fecha graciosamente no livro de Atos, é sustentado por um bom número de conceitos-chave, motivos centrais que [re]aparecem em momentos estratégicos e amarram dessa forma a sua estrutura. São temas como batismo, arrependimento, salvação, plano divino e a relação entre a rejeição e a expansão da mensagem da boa nova.
Dentre esses, o menos importante não será a noção de metanoia/arrependimento. A raiz grega para “arrependimento” aparece 25 vezes no trajeto de Lucas-Atos, número que representa mais de 45% de todas as ocorrências da palavra no Novo Testamento. Mais importante do que observar essas cifras, no entanto, será notar que os demais autores do Novo Testamento, quando usam a palavra, não se dão ao trabalho de defini-la ou de fornecer para ela quaisquer verdadeiros pontos de referência. Lucas é o único autor neotestamentário a apresentar chaves numerosas e inequívocas para que seu leitor entenda a natureza do arrependimento, conforme anunciado por Jesus e por seu precursor, bem como as implicações da idéia para a comunidade cristã e para a sociedade como um todo.
Para o autor de Lucas e Atos o arrependimento é uma forma muito peculiar e prenhe de consequências de mudança de mentalidade. Sua idéia de arrependimento tem, na realidade, pouca relação com a arapuca cheia de implicações teológicas com que tentamos aprisionar a palavra.
Muito embora no evangelho de Lucas João Batista dê início ao seu serviço público apregoando o “batismo de arrependimento tendo em vista a remissão de pecados” (Lucas 3:3), nesta narrativa arrepender-se não é o mesmo que “abraçar o perdão”, nem é o mesmo que “abandonar uma vida de pecado” (pelo menos não no sentido seletivo que costumamos atribuir a perdão e pecado).
Muito embora João Batista deixe muito claro (Lucas 3:8) que o apego à tradição religiosa não tem poder para poupar quem quer que seja da ira vindoura (“nem comecem a dizer em si mesmos: ‘Nosso pai é Abraão’”), para Lucas arrepender-se também não é mero recurso para se evitar a punição divina.
Tanto “abandonar o pecado” quanto “evitar a punição”, idéias através das quais estamos habituados a interpretar o termo arrependimento, tem uma natureza negativa: enfatizam o que não deve ser feito e aquilo que pode ser evitado. Na narrativa de Lucas-Atos, o arrependimento é sempre coisa a ser lida numa lente positiva: diz respeito, invariavelmente, ao que deve ser, a partir daquele momento e para sempre, colocado em prática.
Para Lucas, a mensagem do arrependimento não anuncia coisa alguma a respeito do que Deus está fazendo; ela anuncia tudo a respeito do que você deve fazer. Para Lucas, as implicações do arrependimento não são teológicas, mas práticas. Para Lucas, arrepender-se é um modo de abraçar a salvação pelo método de salvar os outros.
Isso fica evidente desde o primeiro momento em que a idéia é apresentada pelo autor, no terceiro capítulo do seu evangelho. Às multidões que saíam para ser batizadas por ele, João Batista dava a entender, sem qualquer rodeio, que o seu batismo não representava garantia alguma ou mérito algum (vv. 7-8). “O que vocês devem fazer”, ele esclarece em seguida, “é produzir frutos dignos de arrependimento”. Em outras palavras, o que Deus está exigindo de nós não são ritos ou profissões de fé, mas atitudes que evidenciem a nossa mudança de mentalidade. Porque as árvores que não dão frutos – isto é, os adoradores que não produzem evidência da sua mudança de critérios – estão sendo cortadas e lançadas no fogo (v. 9).
Diante dessa exigência, os ouvintes de João Batista apresentam-lhe a pergunta que será ecoada sem alteração pelos ouvintes de Pedro no Pentecostes: o que devemos fazer?
A resposta oferecida pelo Batista é de importância épica, porque revelará quais são, na opinião divina que ele está representando, as implicações da metanoia. Quais são as atitudes que evidenciam o arrependimento/mudança de mentalidade? Que resposta você daria a quem lhe perguntasse quais são as exigências do arrependimento bíblico?
Para surpresa e embaraço eternos de igrejeiros antigos e contemporâneos, o arauto de Deus não entende o arrependimento como chamado à religião ou à abstinência, mas como convocação à justiça social, à integridade e à distribuição de renda:
“Quem tem duas túnicas”, exige João Batista, “reparta com o que não tem nenhuma. Quem tem comida deve fazer o mesmo”.
Para nossa felicidade, alguns cobradores de impostos aparecem logo em seguida para serem batizados por João – isto é, estão dispostos também eles a abraçar o arrependimento, – e fazem-lhe precisamente a mesma pergunta: e nós, o que devemos fazer?
A resposta de João: “Não cobrem mais do que lhes foi prescrito.”
E, logo depois, alguns soldados: e nós, o que devemos fazer?
João: “Não tentem extorquir o que pertence aos outros fazendo denúncias falsas. Contentem-se com o seu soldo”.
Neste ponto será necessário mais uma vez parar no acostamento e enfatizar o caráter absolutamente revolucionário dessas divinas interferências. Pois o reino de Deus anunciado por João Batista e por Jesus não implica apenas na abolição da idéia de religião como esforço de reconciliação com Deus por parte do homem. Nesta nova intervenção Deus não quer nos salvar das nossas faltas ou do castigo que elas requerem, o que seria fácil demais; seu ambicioso e exigentíssimo plano é salvar-nos da nossa mediocridade. Seu plano é salvar-nos de nós mesmos.
Para os arautos das boas novas nos quatro evangelhos, o homem deve arrepender-se não porque o arrependimento é a resposta adequada ao pecado, mas porque teve início um novo e assombroso período da história. A motivação para se adotar a nova mentalidade é a vertiginosa notícia de que o reinado de Deus foi inaugurado. Arrependei-vos, minha gente, porque é chegado o reino de Deus.
E embora não conheçamos o retrato completo deste novo mundo que Deus está sonhando, anunciando e implantando, os evangelhos vão indicando que ele será caracterizado por inúmeras revoluções por minuto em todas as áreas da atividade humana. Este novo mundo requer uma nova mentalidade, uma nova visão de mundo, e adotar esta nova cabeça é precisamente arrepender-se.
É por isso que em suas respostas João Batista vai esclarecendo que o arrependimento deve necessariamente abranger todo um leque de dimensões éticas, sociais e antropológicas.
Como o cerne do projeto do reino é uma reconciliação radical entre os seres humanos, com a consequente criação de uma nova comunidade, a primeira e mais geral revelação é a de que todos, não apenas os ricos, tem a responsabilidade de repartir. Onde todos tem a mesma ausência de merecimento, todos merecem rigorosamente a mesma coisa – pelo que toda e qualquer desigualdade deve ser voluntariamente corrigida pelos componentes do sistema (“quem tem duas túnicas reparta com o que não tem nenhuma. e quem tem comida deve fazer o mesmo”). Em segundo lugar, como explicam as respostas dadas aos soldados e aos cobradores de impostos, a nova era exigirá, mesmo daqueles colocados nas mais comprometedoras posições da sociedade, uma postura radical de integridade pessoal.
A metanoia representa uma revisão completa do modo como os seres humanos interagem uns com os outros, e isso porque o novo estado de coisas do reino exigirá tudo de todos e algo diferente de cada um. Embora acabe representando desafios diferentes de acordo com a presente posição do indivíduo na sociedade, as marcas do arrependimento dizem sempre respeito à relações interpessoais, e requererão invariavelmente uma postura de altruísmo, inclusão e misericórdia. Como deixam abundantemente claro os três exemplos deste episódio de Lucas, arrepender-se é rever a nossa posição sobre quem é digno de Deus, e portanto sobre quem é merecedor da nossa amizade, da nossa lealdade e da nossa túnica extra.
Esta, e não servir de ilustração da vida futura, é a razão de ser da parábola do rico e o Lazáro (Lucas 16:19-31). Na parábola o homem rico mostrou-se merecedor dos tormentos do inferno porque, diante da oportunidade que jazia literalmente à sua porta, recusou-se a arrepender-se. O rico é punido porque negou-se a abraçar a lógica inclusiva do reino e repartir com o Lázaro uma parcela dos seus recursos. De seu posto de sofrimento e exclusão, o rico pede a Abraão que permita que o mendigo se apresente na terra dos vivos aos seus cinco irmãos, porque “se alguém dentre os mortos for ter com eles, eles hão de se arrepender” – isto é, mudarão o seu modo de interagir com os outros/pobres.
Paralelamente, há outro símbolo potente nas respostas dadas por João Batista aos soldados e aos cobradores de impostos. Os dois grupos representavam categorias que viviam – e muitas vezes por boas razões – às margens da aceitação social. Soldados e cobradores de impostos não mereciam tratamento cordial e não tinham cacife para participar da comunidade de Deus. Ao se dispor a responder as suas perguntas, João acaba revelando o impensável: que o arrependimento (e portanto o acesso ao reino e à salvação) está aberto mesmo aos desprezíveis e desprezados, aqueles que a sociedade decidiu serem inteiramente indignos de inclusão social fora do seu próprio círculo. Arrepender-se, na ótica mais ampla do reino, é tanto mudar de idéia a respeito de quem é aceitável quanto passar a viver fornecendo a todos indicação de que todos são aceitáveis.
É preciso lembrar que o mundo da Antiguidade era, talvez ainda mais do que o nosso, regido pela crença indiscriminada em categorias sociais estanques, barreiras que milagre algum podia alterar ou derrubar. A inclusividade brutal do reino de Deus, como proposto por Jesus e João Batista, representava e representa uma tremenda ameaça a esse estado de coisas.
E, como declarado nos evangelhos, a revolução igualitária do reino começa pessoa a pessoa pela guerrilha do arrependimento, que no vocabulário da boa nova não é remorso e não é contrição, mas uma mudança definitiva e radical no modo de se ver e experimentar o mundo e a relação com o Outro.
Arrepender-se é mudar o mundo. Numa palavra, Jesus prega a aceitação de todos, e essa inclusividade requer uma extrema revisão no nosso modo de pensar pessoas e comunidades. Essa mudança de mentalidade altera cada aspecto da vida, e produz uma completa reorientação de crenças, critérios e atitudes.
Na prática, como explicam os exemplos do evangelho de Lucas, o arrependimento trabalhará sempre para corrigir desigualdades e injustiças sociais, morais, éticas, financeiras e religiosas. Contribuirá para alterar visões de mundo que causavam a exclusão. Servirá de instrumento de ressocialização, possibilitando a criação de um comunidade inclusiva sem qualquer paralelo na história anterior ou posterior da humanidade.
Essa reforma de ponto de vista altera o próprio tecido da realidade, porque muda o que as pessoas se mostrarão dispostas a fazer umas pelas outras. Criará ao mesmo tempo um ambiente novo, onde gente de diversas origens e orientações, que vivia antes alienada, poderá conviver como povo de Deus.
Esta insana reprogramação é o que os arautos da boa nova chamam de arrependimento/metanoia.
Amai a vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, bendizei aos que vos maldizem, e orai pelos que vos caluniam.
Ao que te ferir numa face, oferece-lhe também a outra; e ao que te houver tirado a capa, não lhe negues também a túnica. Dá a todo o que te pedir; e ao que tomar o que é teu, não lho reclames.
Assim como quereis que os homens vos façam, do mesmo modo lhes fazei vós também.
Se amardes aos que vos amam, que mérito há nisso? Pois também os pecadores amam aos que os amam. E se fizerdes bem aos que vos fazem bem, que mérito há nisso? Também os pecadores fazem o mesmo. E se emprestardes àqueles de quem esperais receber, que mérito há nisso? Também os pecadores emprestam aos pecadores, para receberem outro tanto.
Amai, porém a vossos inimigos, fazei bem e emprestai, nunca desanimado; e grande será a vossa recompensa, e sereis filhos do Altíssimo; porque ele é benigno até para com os ingratos e maus.
Sede misericordiosos, como também vosso Pai é misericordioso.
Vendo-se as coisas por esta ótica, fica evidente que a parábola do filho pródigo (Lucas 15:11-32) não é contada para constrastar um filho austero e um filho devasso, nem para mostrar a diferença entre um filho volúvel e um pai constante. O conflito central da parábola só é colocado em andamento quando o filho pródigo aparece arrependido no horizonte, porque esta narrativa serve para constrastar duas atitudes possíveis de uma comunidade diante do arrependimento. Por um lado, o pai acolhe o arrependimento como motivo de júbilo e ressocialização; por outro, o filho mais velho vê a inclusão como motivo de ódio e horror.
A lição da parábola está em que na visão de mundo do reino a inclusividade, o perdão e a misericórdia nunca devem ser vistos com rancor ou como falta de critério, mas como ensejo para a mais irrestrita e exuberante celebração. A narrativa explica que é mais fácil um de fora arrepender-se (isto é, sentir-se disposto a incluir e a ser incluído) do que os que se sentem incluídos se mostrarem dispostos a abraçar sem qualquer trâmite os de fora. O verdadeiro desafio do arrependimento, o verdadeiro funil da conversão de mentalidade exigida pelo reino, é sermos capaz de engolir gostosamente essa medida geral e irrestrita de inclusão.
Mas a boa nova não se cala, e insiste imoderadamente que a conversão de mentalidade do reino está ao alcance de todos – até mesmo de patifes como nós, que via de regra não nos consideramos pecadores como os outros. Porém, a história conta que para nós arrepender-se representará aceitar no nosso seletíssimo círculo a inclusão daqueles de que estamos absolutamente convictos não merecem nossa consideração – quanto mais nosso beijo, nosso abraço e um lugar inesperado à mesa.

Paulo Brabo
www.baciadasalmas.com

domingo, 7 de novembro de 2010

NOVA CRIATURA

Li recentemente um comentário sobre o novo livro de Ronald Sider: The Scandal of the Evangelical Conscience (“O escândalo da consciência evangélica”), no qual, a partir de dados estatísticos colhidos em pequisas encomendadas aos institutos Gallup e Barna, além de levantamentos feitos por universidades, o autor traça um retrato da Igreja Evangélica nos Estados Unidos. E a conclusão é trágica. As pesquisas indicaram que o padrão de comportamento dos cristãos – não os nominais, mas aqueles que afirmam ter nascido de novo e que participam regularmente de suas igrejas – não é em nada diferente daqueles que se declaram não-cristãos.
O índice de casos de divórcio e adultério e o uso de pornografia entre os adultos cristãos e os não-cristãos é o mesmo. O percentual de doações que os cristãos fazem em suas igrejas caiu ao mesmo tempo em que a renda per capita aumentou muitissimo, o que mostra que o materialismo e o estilo de vida individualista entre eles não diferem muito do daqueles que se declaram sem religião. No grupo dos cristãos, a atividade sexual de adolescentes e jovens antes do casamento e o índice de doenças sexualmente transmitidas ficam apenas um pouco atrás do que a média nacional. Episódios de racismo, abusos e a violência doméstica também apresentam índices alarmantes entre o segmento que diz conhecer Jesus.
Diante destes dados, Ron Sider traz à luz a profunda hipocrisia do cristianismo e a completa irrelevância do testemunho da Igreja na América do Norte. Infelizmente, não temos pesquisas desta natureza aqui no Brasil, mas eu arriscaria, mesmo que empiricamente, dizer que nossa situação, se não é igual, talvez seja até pior. No entanto, o problema maior, a meu ver, é um dado estatístico que aparece nessas pesquisas e diz que apenas 9% dos cristãos adultos e 2% dos cristãos adolescentes e jovens têm uma cosmovisão bíblica. Ou seja, mais de 90% do chamado povo de Deus não interpretam a realidade, a cultura, o mundo, o trabalho, as relações, a sexualidade e outros aspectos da vida a partir de um fundamento bíblico – daí, não fica tão difícil entender porque os cristãos em nada diferem dos não-cristãos em seu testemunho ético e moral.
Minha preocupação, olhando para o cenário brasileiro, não é em relação a algum aspecto particular da conduta moral ou ética dos crentes, mas com a ausência de um fundamento bíblico, teológico e doutrinário para a vida e missão cristã. O marco inicial da vida cristã é nossa conversão a Cristo. Este é o evento que estabelece o ponto de partida da nova vida em Jesus. O apóstolo Paulo descreve tal evento com as seguintes palavras: “Fui crucificado com Cristo. Assim, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim. A vida que agora vivo no corpo, vivo-a pela fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou por mim” (Gálatas 2:20). É assim que ele resumidamente descreve o que aconteceu desde o dia em que o Salvador se revelou a ele no caminho de Damasco. Agora, Paulo reconhece que o “velho Saulo” já não vive mais, mas é Cristo que vive pelo poder do Espírito Santo nele. Trata-se de uma nova vida vivida agora pela fé e naquilo que Jesus fez por ele. Isto é o que chamamos de conversão.
Naquele momento em que o Senhor se revelou a ele, Paulo reconheceu que tudo que ele pensava ser certo, toda a sua religiosidade que fez dele um homem tão íntegro e responsável, na verdade estava levando-o para um caminho completamente oposto ao de Deus. Ele, que se julgava um grande amigo de Deus, fazendo o melhor que podia para preservar a pureza daquilo que cria ser a sua vontade, viu-se como um inimigo do Senhor ao ouvir de Cristo: “Sou Jesus, a quem você está perseguindo”.
Aquele encontro transformou radicalmente, e para sempre, a vida de Paulo. Ainda caído no chão, ouviu Jesus dizer a ele: “Agora, levante-se, fique em pé. Eu lhe apareci para constituí-lo servo e testemunha do que você viu a meu respeito e do que lhe mostrarei”. Paulo ergueu-se para iniciar uma nova jornada, uma nova vida, uma nova missão. Depois de passar três anos na Arábia, ele volta para Jerusalém e inicia seu longo ministério, proclamando as boas novas do Evangelho de Cristo ao mundo.
Paulo tinha uma vida comum a muitas pessoas. Era um homem íntegro, zeloso e coerente com suas convicções, como alguns de nós. No entanto, quando Cristo se revelou como Filho de Deus e Salvador, ele se entregou completamente. As coisas velhas ficaram para trás; suas antigas ambições foram abandonadas, seus velhos princípios, valores e conceitos, também foram deixados para trás. Não era mais o mundo quem determinava o certo ou o errado, nem mesmo sua consciência tinha a última palavra – o que lhe importava era Cristo, sua palavra, sua cruz, sua ressurreição, sua vontade. Foi uma experiência que mudou a compreensão que Paulo tinha do mundo e dos seus valores, alterando radicalmente sua cosmovisão e estabelecendo novos paradigmas que iriam conduzir sua vida, seus valores, princípios e trabalho.
Temos perdido este conceito tão central e fundamental da conversão. O Cristo que queremos servir não é mais aquele que se revela a nós, mas um que criamos a partir daquilo que nos interessa. A vida cristã não significa mais o “ser nova criatura”, mas permanecer sendo a mesma criatura, com um leve toque de verniz religioso. Não é mais a voz de fora que fala conosco, mas uma voz de dentro, um apelo nascido da vaidade, do medo, do egoísmo e dos desejos confusos e desordenados que povoam nossa natureza caída.
Precisamos recuperar o significado de dizer: “Fui crucificado com Cristo. Assim, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim. A vida que agora vivo no corpo, vivo-a pela fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou por mim”. Precisamos voltar a viver pela fé no Filho de Deus, e não pelos impulsos da nossa natureza caída ou atraídos pelo fascínio de uma cultura que nega a cruz de Cristo.

Ricardo Barbosa de Souza

www.eclesia.com.br

terça-feira, 19 de outubro de 2010

COMO ESCOLHER, ENTRE DOIS DISCÍPULOS, UM APÓSTOLO

Então, enquanto aguardam a chegada do dom do céu que iria ensiná-los a ser testemunhas, ocorre aos discípulos, para preencher o silêncio, decidir por si mesmos o que é ser uma.
Ressentindo-se da lacuna deixada pela traição do Iscariotes, Pedro levanta-se e propõe (citando versos vagamente contraditórios do livro de Salmos) que o grupo reunido escolha um dos discípulos para unir-se aos onze apóstolos restantes, de modo a completar "o grupo dos doze".
Não se deixe enganar pela singeleza da narração: trata-se de ocasião tremendamente momentosa, que derramará profundas fissuras Novo Testamento adentro. Pedro não está aqui apenas advogando a consistência numérica ou tentando preservar de modo inocente uma tradição iniciada por Jesus. O que acontece é mais ambicioso e mais prenhe de conseqüências.
Pedro está, por iniciativa própria, definindo o que Jesus queria dizer – e com que estava falando – quando observou, antes da ascensão: "vocês receberão o poder do Espírito Santo e serão minhas testemunhas". Selecionar é interpretar, e Pedro pede que encontrem "um homem que acompanhou os doze durante todo o tempo em que Jesus conviveu com eles, a começar do batismo de João até o dia em que ele foi recebido no alto diante deles". Embora fosse provavelmente seletiva o bastante para eliminar a maior parte dos discipulos reunidos naquele dia, essa descrição não é definição de Pedro de uma testemunha, mas de um candidato a testemunha.
Quando dois nomes são indicados, o grupo vê-se obrigado a eliminar um – visto que na interpretação de Pedro os apóstolos divinamente apontados não poderão ser mais do que doze, conforme a configuração original. O ajuntamento solicita austeramente a predileção divina e realiza um sorteio, que consagra Matias e elimina da corrida Barsabás – não que nem um nem outro voltem a ser mencionados na história.
Com isso fica claro de antemão, diante do grupo, que a condição de testemunha de Cristo é algo a que nem todos – na verdade, muito longe disso – podem almejar. Pedro estabelece tanto os requerimentos formais da posição quanto os limites da sua circunscrição – e assim, num golpe só, transforma uma idéia que Jesus deixara no ar numa muito rígida instituição.
Ficou estabelecida, nesse único gesto, a tradição que viria a ser conhecida como autoridade apostólica: a noção de que o círculo mais interno de doze discípulos (justamente por terem estado mais perto de Jesus, no sentido literal) desfrutava de uma espécie de inalienável aval divino. O parecer desse grupo de apóstolos passava a ser considerado inquestionável tanto em termos administrativos quanto teológicos. Dito sem rodeios, Jesus mal havia esfriado no túmulo e os discípulos já haviam inventado uma hierarquia (com o passar dos tempo, interpretou-se que essa autoridade ia sendo transferida para os novos discípulos que viveram mais perto deste círculo inicial de discípulos, e assim por diante até o infinito. A autoridade espiritual reduzira-se a traços de uma radioatividade original que ia se esvaindo).
Jesus dissera que os discípulos aguardassem o poder do alto, mas Pedro, do alto de sua posição, já está distribuindo poder. O que redime a história é que o Espírito de Cristo, onde quer que esteja nesse momento, tem outras idéias.

Paulo Brabo
www.baciadasalmas.com



sábado, 16 de outubro de 2010

OSTRA FELIZ NÃO FAZ PÉROLA

Ostras são moluscos, animais sem esqueleto, macias, que são as delícias dos gastrônomos. Podem ser comidas cruas, com pingos de limão, com arroz, paellas, sopas. Sem defesas – são animais mansos – seriam uma presa fácil dos predadores.
Para que isso não acontecesse a sua sabedoria as ensinou a fazer casas, conchas duras, dentro das quais vivem. Pois havia num fundo de mar uma colônia de ostras, muitas ostras. Eram ostras felizes. Sabia-se que eram ostra felizes porque de dentro de suas conchas saía uma delicada melodia, música aquática, como se fosse um canto gregoriano, todas cantando a mesma música. Com uma exceção: de uma ostra solitária que fazia um solo solitário. Diferente da alegre música aquática, ela cantava um canto muito triste. As ostra felizes se riam dela e diziam: “Ela não sai da sua depressão...” Não era depressão. Era dor. Pois um grão de areia havia entrado dentro da sua carne e doía, doía, doía. E ela não tinha jeito de se livrar dele, do grão de areia. Mas era possível livrar-se da dor. O seu corpo sabia que, para se livrar da dor que o grão de areia lhe provocava, em virtude de suas aspereza, arestas e pontas, bastava envolvê-lo com uma substância lisa, brilhante e redonda. Assim, enquanto cantava seu canto triste, o seu corpo fazia o seu trabalho – por causa da dor que o grão de areia lhe causava.
Um dia passou por ali um pescador com o seu barco. Lançou a sua rede e toda a colônia de ostras, inclusive a sofredora, foi pescada. O pescador se alegrou, levou-as para a sua casa e sua mulher fez uma deliciosa sopa de ostras. Deliciando-se com as ostras de repente seus dentes bateram numa objeto duro que estava dentro da ostra. Ele tomou-o em suas mãos e deu uma gargalhada de felicidade: era uma pérola, uma linda pérola. Apenas a ostra sofredora fizera uma pérola. Ele tomou a pérola e deu-a de presente para a sua esposa. Ela ficou muito feliz...”
Ostra feliz não faz pérolas. Isso vale para as ostras e vale para nós, seres humanos. As pessoas que se imaginam felizes simplesmente se dedicam a gozar a vida. E fazem bem. Mas as pessoas que sofrem, elas têm de produzir pérolas para poder viver. Assim é a vida dos artistas, dos educadores, dos profetas. Sofrimento que faz pérola não precisa ser sofrimento físico. Raramente é sofrimento físico. Na maioria das vezes são dores na alma.

Rubem Alves

sábado, 2 de outubro de 2010

O TEMPO E A ETERNIDADE

Trabalhar é cooperar com Deus para colocar ordem no caos. Na verdade, qualquer boa ação é um gesto solidário ao coração de Deus, que sempre desejou que esse mundo fosse um jardim. Dizem que quem não faz parte da solução, faz parte do problema, e, nesse caso, todo cristão deve agir como parte da solução para que o caos social, político, econômico, ético e ecológico seja revertido o máximo possível. Existe uma lógica para isso. Aliás, uma lógica que nem todo cristão alcança. Por exemplo, quem acredita que haverá um dia quando Jesus substituirá esse mundo por um novo e uma nova terra, não tem muita razão para trabalhar para que este mundo seja melhorado e transformado. Por que gastar tempo, recursos e dedicar a vida a manter e aperfeiçoar algo que vai acabar? Talvez, no mínimo para evitar que o caos inviabilize nossa vida nesse mundo ou acabe batendo à nossa porta: até quem pensa que esse mundo vai acabar mesmo não deseja ficar sem água, ter um filho vítima da violência urbana ou ser usurpado por um governo corrupto. Talvez para anunciar que o reino de Deus virá em breve, e que é bom que as pessoas comecem a se preparar para viver nele, que, aliás, já dá os seus sinais. De fato, cuidar do mundo enquanto vivemos nele e promover sinais históricos do reino de Deus na história são duas excelentes razões para que todo cristão se comprometa a cooperar com Deus para colocar ordem no caos.
Mas, consideremos uma terceira razão. E se o novo céu e a nova terra não forem "outro mundo", mas esse mundo, levado, por Deus, à sua plenitude? E se nosso trabalho e boas ações repercutirem na eternidade como matéria prima que Deus usa para a transformação desse mundo em novo céu e nova terra? Você já imaginou a possibilidade de que, assim como você vive para sempre, seu trabalho e suas boas obras também subsistam por toda a eternidade, e que os sinais históricos do reino de Deus não cairão no vazio do nada, mas continuarão testemunhando a graça e a glória de Deus para todo o sempre?
Jesus disse que as pessoas abençoadas por nós na história nos receberão na eternidade. Paulo, apóstolo, disse que no juízo final Deus colocaria fogo na casa que construímos na história e preservaria apenas o que fosse ouro, prata e pedras preciosas. João, apóstolo, disse que a Nova Jerusalém desce do céu: desce para onde? O "fim do mundo" no Novo Testamento é mais parecido com uma mudança de tempo ou era (este século e o vindouro) do que uma mudança de endereço ou lugar. Os rabinos acreditam que "as boas ações dos homens são as sementes que Deus usa para plantar as árvores do pa.
raíso". É possível que não estejam muito longe de ter razão.

Pr. Ed Rene Kivitz

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

DEZ COISAS TÃO SIMPLES QUANTO ESSENCIAIS À VIDA!


1. Nunca descreia do poder do amor, ainda que você demore muito a ver os resultados;

2. Não tema pedir em oração, pois o Pai tem prazer em nos ouvir pedindo em fé confiante; mas lembre que Deus não está preso à oração, posto que somente nos atenda naquilo que Ele, como Pai, não julgue que nos fará mal;

3. Leia as Escrituras, especialmente a parte chamada de Novo Testamento; pois toda pessoa que, tendo tal chance, não a use, demonstra que não deseja mesmo conhecer a Deus; posto que seja pela leitura da Palavra que melhor se possa discernir a vontade de Deus;

4. Exercite-se na dadivosidade e na generosidade, pois por tais exercícios seu coração se manterá sóbrio em relação a dinheiro e poder;

5. Nunca fuja de uma necessidade humana que você possa ajudar a resolver... Seria como fugir de Jesus;

6. Fuja do pensamento malicioso. Seja sábio e sóbrio, mas não olhe com malicia, posto que o olhar malicioso corrompa todo o seu ser;

7. Cuidado com todas as raízes perversas... Sim, cuide de seu coração para que nele não cresçam as raízes da inveja, da amargura, da arrogância ou da auto-vitimização; pois essas são as piores raízes a serem deixadas vivas no chão do ser;

8. Nunca se sinta importante, pois tiraria toda a sua naturalidade de ser e viver...; além de que tal sentir é a ladeira para o abismo;

9. Nunca fuja de nenhuma verdade sobre você ou sobre quem você ame; pois, por tal evasão perde-se o discernimento e mergulha-se o ser no escafandro do auto-engano no fundo de um mar de rochas... Além disso, quem determina um auto-engano no pouco, esse será enganado no muito;

10. Ame a Deus e ao próximo; e não existirá lugar para ídolos em seu coração.

Estas são coisas simples e vitais... E aqueles que as seguem sempre são bem-sucedidos em tudo o que fazem; posto que seu fluxo de energia decorra da fonte do que é em Deus.

Nele,

Caio

www.caiofabio.com

sábado, 4 de setembro de 2010

RENÚNCIA: CAMINHO DE BENÇÃOS


“A renúncia é a libertação. Não querer é poder.” (Fernando Pessoa)

Renúncia, no dicionário, tem simples significados: abrir mão, desistir da posse, rejeitar, recusar, não querer, deixar voluntariamente. Na prática, a renúncia talvez seja o maior desafio do cristão.
Estamos acostumados a fazer nossos planos e tomar diariamente nossas decisões. Sentimos segurança nessa atitude. Achamos que, assim, sabemos onde estamos pisando e para onde estamos indo. Queremos, a todo custo, ser donos da nossa própria vida.
Mas o chamado de Jesus é justamente o contrário. Ele nos convida a uma vida de entrega a Deus. E não se trata de uma simples entrega; é a entrega da nossa vida, caminhos e decisões.
O Senhor nos convoca a essa trajetória com autoridade, pois Ele mesmo a trilhou. Sua principal palavra de renúncia foi no Getsemani, próximo da morte: "Aba, Pai, tudo te é possível; passa de mim este cálice; contudo, não seja o que eu quero, e sim o que tu queres" (Mc. 14.36).
A Palavra de Deus afirma: “Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, pois ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes, a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura humana, a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até à morte e morte de cruz” (Fp.2.5-8).
E por que uma vida de renúncia e entrega seria o melhor para o homem?
Porque a queda da humanidade trouxe-nos muitas limitações e o pecado nos impede de fazer escolhas corretas. Somente Deus é capaz de nos guiar para a direção certa e decisões seguras. Compreendendo que somos incapazes e restritos, conseguimos entender a extensão do amor do Senhor e a Sua capacidade de nos oferecer o melhor para nossas vidas.
Tiago (4.13-15) alerta: “Atendei, agora, vós que dizeis: Hoje ou amanhã, iremos para a cidade tal, e lá passaremos um ano, e negociaremos, e teremos lucros. Vós não sabeis o que sucederá amanhã. Que é a vossa vida? Sois, apenas, como neblina que aparece por instante e logo se dissipa. Em vez disso, devíeis dizer: Se o Senhor quiser, não só viveremos, como também faremos isto ou aquilo.”
Somente a fé na eficácia do sacrifício de Jesus nos permite uma vida de renúncia. Ninguém, em sã consciência, entregaria seu destino a outro, a não ser que conhecesse intimamente a intenção e a capacidade desse novo senhor de sua vida. Paulo entendeu e fez uma declaração que pode nos ajudar: “Estou crucificado com Cristo; logo, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim; e esse viver que, agora, tenho na carne, vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e a si mesmo se entregou por mim” (Gl. 2.20).
Deixar o Senhor reinar em nós é o ápice da caminhada em Cristo. Essa confiança nos certifica a maturidade cristã, pois somos capazes de devolver a Jesus aquilo que Ele nos ofereceu: a vida.
Também somos participantes com Ele das bênçãos daí advindas. A Jesus, “Deus o exaltou sobremaneira e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, nos céus, na terra e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é Senhor, para glória de Deus Pai” (Fp 2; 9-11). E a nós, Ele garantiu: “Quem a si mesmo se exaltar será humilhado; e quem a si mesmo se humilhar será exaltado” (Mt. 23.12).
A renúncia de nossos desejos e projetos pode ser extremamente difícil. Para quase todos nós é uma luta diária travada em nossas mentes e corações. Mas é ela que nos liberta e nos livra de nossas próprias escolhas errôneas. Estejamos seguros e determinados a essa ação, com a confiança de que são do Senhor os melhores planos e os melhores desígnios para as nossas vidas.

Rosane Itaborai Moreira

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

SINAIS DOS TEMPOS

O amor vem esfriando na medida em que crescem a iniquidade, o individualismo, o narcisismo.

Os discípulos de Cristo, um dia, perguntaram a ele quais seriam os sinais que antecederiam a sua vinda. Ele respondeu esta pergunta numa longa pregação, conhecido como “sermão profético”. Entre os sinais apresentados por Jesus, destaca-se o surgimento de falsos Cristos e falsos profetas, que iriam enganar muitas pessoas. O Filho de Deus falou também de guerras entre as nações e de abalos sísmicos. No entanto, há um sinal que me chama a atenção de forma particular: trata-se daquele que fala do esfriamento do amor. Jesus disse: “E por se multiplicar a iniqüidade, o amor se esfriará de quase todos” (Mateus 24.12).
A relação que Jesus apresenta é inversamente proporcional: o crescimento da iniquidade implica no enfraquecimento do amor. Vejam se não é esse o nosso caso. Na medida em que cresce o pecado em suas mais variadas formas, da corrupção ao crescimento da miséria social, da pornografia a todas as formas de banalização sexual, a violência nas ruas e nos lares, o individualismo autocentrado e narcisista, esfria o amor genuíno e sincero no ser humano. Somos uma geração que vem desaprendendo a amar. Não estou me referindo a uma forma platônica de amor ou aos modelos hollywoodianos que enchem nossa sala de estar todos os dias, mas ao amor conforme Deus o revela nas Escrituras. Amor naquela forma como ele mesmo nos tem amado e celebrado uma aliança com seu povo. Provavelmente não há nenhum texto mais completo sobre o amor do que I Coríntios 13, um texto que precisa ser revisitado por nós diante daquilo que vemos todos os dias. Naquela epístola, Paulo fala de um amor que é paciente, que não se perde diante da primeira crise ou da primeira desilusão; um sentimento bondoso, não ciumento e humilde. Um amor que não se comporta de forma inconveniente, mas é altruísta, e está sempre procurando atender o interesse dos outros e não o seu próprio. É também um amor que não se ira facilmente, que não guarda rancor, que não se alegra com a injustiça mas que salta de júbilo quando a verdade triunfa. É um amor que sabe que o sofrimento sempre acompanha aquele que ama. Um amor que se sustenta sob fundamentos sólidos e verdadeiros, que não tem a pressa dos egoístas, mas que sabe esperar e possui uma enorme capacidade de suportar adversidades.
Este amor que Paulo nos descreve vem diminuindo e esfriando na medida em que cresce o egoísmo alimentado pelo individualismo da cultura narcisista, onde o que importa sou eu, meus desejos, meus interesses, meu momento, minhas necessidades, minha realização, meus projetos, o que eu penso, quero e preciso. Imagino que quando duas pessoas modernas, com este espírito individualista e narcisista, se encontram e resolvem se amar, envolvem-se num modelo de relacionamento onde, à primeira vista, tudo indica que se trata de um belíssimo e invejável romance. Contudo, diante do primeiro obstáculo, da primeira frustração, de um simples desentendimento, da dor e do sofrimento, ou do cansaço e da vontade de experimentar “novos ares”, abandonam aquele amor que foi grande apenas enquanto durou em troca de um outro que atenda as necessidades de um ego inflado, imaturo e insaciável.
É por causa da iniquidade deste espírito individualista e narcisista que os pais vão abandonando os seus filhos porque têm coisas mais importantes a fazer, como ganhar dinheiro ou buscar o sucesso, do que cuidar deles e amá-los; alguns tornam-se indiferentes e os abandonam à própria sorte na esperança de que na escola ou na vizinhança encontrarão quem os ame e eduque. Outros há que tentam manipulá-los e controlá-los em virtude da mesma iniqüidade, da mesma falta de tempo e da mesma insegurança. Os mais modernos já preferem não tê-los porque sabem que o amor que possuem não ultrapassa a epiderme – não são capazes de amar nada além do seu próprio ego. Por outro lado, os filhos vêm se rebelando contra seus pais, negando-lhes o respeito e a honra. São também filhos da iniquidade do nosso tempo, do mesmo individualismo, do mesmo egoísmo.
Os jovens trocaram o amor pelo sexo para descobrirem lá na frente, depois de tantas idas e vindas e muitas “ficadas”, que são bons de cama mas frios e imaturos na arte de construir um amor que supera as fronteiras do egoísmo e que cresce na medida que o tempo passa. Os escândalos de corrupção que mais uma vez abalam o país têm, na sua raiz, o mesmo mal. Todos buscam o que é seu e nunca o que é dos outros. A epidemia que hoje toma conta da nação não é a corrupção – ela é apenas mais uma expressão de uma nação, onde a iniquidade cresceu tanto que fez o amor murchar.
Eu nunca fui um desses crentes interessados em decifrar os códigos para adivinhar quando é que Jesus Cristo volta. Tal aritimética não me interessa. Apenas sei que ele voltará, e isso me basta. No entanto, devo confessar que olhando para o cenário do mundo hoje, tenho orado por uma intervenção divina e espero que ela aconteça logo, seja na forma de um novo avivamento – daqueles que penetram na raiz do coração humano e o transforma e não esta panacéia religiosa que alguns chamam de “derramamento do Espírito” – ou de uma intervenção escatológica, final ou não. Oro por isto porque não é mais possível suportar tanta injustiça, tanta miséria, tanta imoralidade, tanto pecado. Oro também para que Deus nos preserve fiéis a ele e à sua Palavra, para que aqueles que reconhecem o amor divino e são alimentados e inspirados por ele cresçam cada vez mais amparando o pobre, cuidando do necessitado, lutando pela justiça, permanecendo fiéis aos termos da aliança com Deus e com o próximo. Jesus, naquele sermão profético, afirma que “o amor se esfriará de quase todos”. E é nesta pequena exceção que quero me incluir, a mim e a você, mesmo que sejamos apenas um pequeno remanescente, mas um remanescente que não se curva diante dos Baalins do mundo moderno.

Pr. Ricardo Barbosa de Souza

sábado, 28 de agosto de 2010

A RESPEITO DA ÉTICA

Deixa de ser bobo, todo mundo faz. Esta é a frase mais usada para justificar o comportamento ilícito. Dentro dela estão embutidas práticas como a do médico que solicita um “por fora” argumentando que a remuneração do plano de saúde não é satisfatória; do empresário que molha a mão do pessoal que libera carga na alfândega; do pai de família que trabalha sem carteira assinada e do empregador que contrata o pai de família; do vendedor que dá uma comissão ao comprador para fechar negócio; do comerciante que compra nota fria para tributar menos ou sonegar; do consumidor que compra produto pirateado porque senão não poderia comprar; da sacoleira que trabalha no mercado informal para sustentar quatro filhos; e assim por diante, numa lista de comportamentos interminável assimilados como “naturais” neste mercado selvagem.
O cenário comporta múltiplas abordagens, e qualquer um que acredite estar diante de um problema de fácil solução certamente está fazendo uma análise simplista. Por exemplo, basta lembrar que o comportamento ilícito tem suas variáveis. Pelo menos duas, para ser simples sem ser superficial. A primeira diz respeito aos agentes. A segunda, aos eventos. Quanto aos agentes, os não éticos podem ser divididos entre os que fazem por estilo de vida, como os criminosos que montam uma estrutura de mercado e governo paralelos; e os que fazem por necessidade, como os que se colocam à beira da calçada e estão mais para sobreviventes do que para imorais. Já em relação aos eventos, devemos admitir que há distinção entre a transgressão como recurso emergencial, como a do camarada que aceita ser achacado pela autoridade que criou a dificuldade para vender a facilidade, e a transgressão como meio de vida, como a da autoridade que vive criando dificuldade. De minha parte, embora coloque tudo no pacote do fracasso ético, aceito dialogar com quem acredita que “uma coisa é coisa e outra coisa é outra coisa”.

Ética, moral e lei

Na busca de caminhos para o comportamento ético, podemos entrar pela porta das definições elementares. Devemos, por exemplo, fazer distinção entre ética e moral. O Frei Leonardo Boff ilumina nossa caminhada dizendo que “Ethos, ética, na língua grega designa a morada humana. O ser humano separa uma parte do mundo para, moldando-a ao seu jeito, construir um abrigo protetor e permanente. A ética, como morada humana, não é algo pronto e construído de uma só vez. O ser humano está sempre tornando habitável a casa que construiu para si. Ético significa, portanto, tudo aquilo que ajuda a tornar melhor o ambiente para que seja uma moradia saudável: materialmente sustentável, psicologicamente integrada e espiritualmente fecunda. A ética não se confunde com a moral. A moral é a regulação dos valores e comportamentos considerados legítimos por uma determinada sociedade, um povo, uma religião, uma certa tradição cultural etc. Há morais específicas, também, em grupos sociais mais restritos: uma instituição, um partido político... Há, portanto, muitas e diversas morais. Isto significa dizer que uma moral é um fenômeno social particular, que não tem compromisso com a universalidade, isto é, com o que é válido e de direito para todos os homens. Mas, então, todas e quaisquer normas morais são legítimas? Não deveria existir alguma forma de julgamento da validade das morais? Existe, e essa forma é o que chamamos de ética”.
Moral identifica um modo de agir humano, regido por normas e valores, por hábitos e costumes. A moral se relaciona com o comportamento prático do homem. Ética é uma reflexão teórica que analisa, critica ou legitima os fundamentos e princípios que regem um determinado sistema moral.
. Ética é princípio; moral são aspectos de condutas específicas;
. Ética é permanente; moral é temporal;
. Ética é universal; moral é cultural;
. Ética é teoria; moral é prática.
As leis estão no campo da moral, e devem ser avaliadas a partir de seus pressupostos éticos. Para que você entenda melhor, a afirmação de que todos os seres humanos são iguais perante Deus é uma afirmação ética, um princípio universal, e a lei que considera crime a segregação racial é uma aplicação moral, bem como a lei que condena a escravidão.
A ética deve ser, portanto, aplicada moralmente através dos códigos legais. As leis são instrumentos de regulamentação social. De acordo com Clive Staples Lewis, teólogo inglês, as leis são necessárias, pelo menos por três razões. Em primeiro lugar, para promover uma arrumação e harmonização no interior de cada ser humano em particular. Depois, para promover a justiça e a harmonia entre os seres humanos. Finalmente, com o objetivo geral da vida humana como um todo, com o fim para o qual o homem foi criado, que se consolida na possibilidade de um mundo justo e fraterno habitado por seres humanos plenamente realizados, o que muitos de nós chamaríamos céu ou paraíso.
Em termos práticos, Lewis está dizendo que “a lei protege a pessoa”, e por isso o Ministério da Saúde obriga advertências nos produtos tóxicos como fumo e álcool. Além disso, “a lei promove a justiça”, o que justifica a tributação como instrumento de distribuição de renda. Por fim, a lei viabiliza a utopia, que se expressa, por exemplo, na Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Cristianismo: ética, moral e consciência

É certo que o Cristianismo possui suas premissas éticas (grade de valores) que determinam sua moral (leis, mandamentos e costumes). Mas também é certo que a proposta do Cristianismo não é um chamado para que se viva em obediência a leis e mandamentos morais. O Cristianismo convida a uma nova consciência, isto é, desafia cada ser humano a interpretar a lei (moral) à luz da ética.
É fácil de explicar as razões deste desafio à consciência. Tenho basicamente quatro justificativas. Em primeiro lugar, todos sabemos que nem tudo o que é legal é ético, isto é, nem sempre a observância da lei é o melhor caminho para a realização do ideal ético e promoção da justiça. O aborto, a eutanásia e a pena de morte podem se tornar legais, mas ainda assim continuarão a suscitar discussões éticas.
A segunda justificativa da valorização da consciência acima da lei, é que a lei não é suficientemente abrangente. Uma vez que o ser humano é um universo infinito, também as relações entre seres humanos será um universo infinito. A lei nunca será abrangente o suficiente para promover a justiça em todos os espectros possíveis da complexidade das relações humanas. Cada sociedade vai desenvolver seus códigos morais em razão da necessidade da sobrevivência e da convivência. O Dr. Drauzio Varella discute bem essa questão em seu livro Carandiru, que retrata o dia-a-dia daquele que foi o maior complexo penitenciário da América Latina.
Um terceiro argumento está baseado no fato de que a lei se flexibiliza diante da ética. A lei, que em tese é rígida em sua norma, se submete à ética, que é dinâmica em sua hierarquia de valores. Por esta razão é que o sujeito que rouba para dar de comer aos filhos pode ser absolvido pelo tribunal: a vida é um valor maior que o direito à propriedade. Acredito que foi isso o que Jesus tentou ensinar ao afirmar que “o sábado foi feito por causa do homem, e não o homem por causa do sábado”, isto é, a lei deve estar a favor da vida.
Finalmente, a lei é reguladora dos fatos sociais, e nesse caso, não havendo o fato que a justifica, a lei perde seu sentido. Quem ficaria parado de madrugada numa rua deserta só porque o sinal está fechado? O policial que lavrasse uma multa por avanço de sinal às duas da madrugada numa rua deserta estaria cumprindo a lei? Novamente voltamos ao paradoxo entre o sábado e o homem.
Fica claro, portanto, que somente o tolo obedece sempre, e somente o sábio é capaz de desobedecer a lei sem transgredir a ética. Poucos são os capazes de andar na ilegalidade sem cair na imoralidade. E isso faz do Direito uma ciência extraordinária e bela, pois visa a justiça, acima da lei. Está explicado porque o Cristianismo, em vez de apresentar um novo código moral, faz um convite desafiador à nova consciência.

Princípios éticos à luz do Cristianismo

Em relação à questão da vida profissional e das relações no mercado, posso dar exemplos de princípios éticos derivados dos valores cristãos. falando de resultados, o Cristianismo, por exemplo, é diferente do Pragmatismo. O Pragmatismo diz que o que dá certo é certo, enquanto o Cristianismo diz que o que é certo vale mais do que o que dá certo. Isto é, nem tudo que dá certo é certo. Algumas coisas, inclusive, nós fazemos sabendo que resultarão em prejuízo para nós – darão “errado” – mas preservarão nossa dignidade e honra, isto é, a nossos valores éticos. O caráter sempre vale mais do que os resultados.
Falando de gente, as pessoas sempre valem mais do que os papéis que desempenham: o faxineiro é tão digno quanto o presidente da corporação. Os relacionamentos sempre valem mais do que os negócios. A fraternidade está acima do lucro. A solidariedade está acima das posses.
Falando de dinheiro, a justiça vale mais do que a prosperidade, e o bem comum vale mais do que a riqueza pessoal. O bem estar individual não pode existir às custas da indiferença social. Lembre da figura do vampiro que suga o sangue de todo mundo até sobrar apenas o sangue dele: o genocídio é uma espécie de suicídio. Riqueza sustentável é riqueza compartilhada. Dinheiro vivo é dinheiro circulando, repartido, distribuído.

Caminhos pessoais

Alguém já disse que a melhor maneira de mudar o mundo é fazer um circulo ao redor de si mesmo e começar as mudanças a partir do lado de dentro do círculo. Os alemães dizem que devemos pensar globalmente e agir localmente, o que deve ter dado origem ao seu provérbio que diz que “em pequenas vilas, pequenas pessoas estão fazendo pequenas coisas que estão mudando o mundo”. Nesse caso, mesmo sabendo que esta questão não será equacionada sem a mobilização social e as transformações estruturais promovidas pela ação política, sugiro alguns compromissos pessoais-individuais.
#1 Jamais negocie os valores arraigados em sua consciência. Caráter não tem preço. É melhor dormir mal porque falta cama, do que dormir mal porque a consciência pesa. As pessoas que me procuram à guisa de dilemas éticos geralmente estão em defesa de seu padrão de vida, em vez de em luta pela sobrevivência. O problema de muita gente não é a impossibilidade de fazer o que é certo, mas a dificuldade ou recusa em assumir o ônus do que é certo. Muito raramente me deparo com pessoas que não sabem o que fazer. Geralmente encontro pessoas que não têm coragem de fazer o que sabem que devem fazer.
. É melhor ter pouco com o temor de Deus do que grande riqueza com inquietação. (Provérbios 15.16)
. É melhor ter pouco com retidão do que muito com injustiça. (Provérbios 16 .8)
. Melhor é um pedaço de pão seco com paz e tranqüilidade do que uma casa onde há banquetes, e muitas brigas. (Provérbios 17.1)
. Melhor é ser pobre do que mentiroso. (Provérbios 19.22)
. Melhor é o pobre íntegro em sua conduta do que o rico perverso em seus caminhos. (Provérbios 28.6)
#2 Faça distinção entre a prática eventual do ilícito e o estilo de vida ilícito. A Bíblia também recomenda: “Não seja excessivamente justo nem demasiadamente sábio; por que destruir-se a si mesmo? Não seja demasiadamente ímpio e não seja tolo; por que morrer antes do tempo? É bom reter uma coisa e não abrir mão da outra, pois quem teme a Deus evitará ambos os extremos” (Eclesiastes 7.16-18). Não encaro isso como “licença para ser imoral de vez em quando”, mas como recomendação da sabedoria para julgar e discernir a partir de uma hierarquia de valores.
#3 Pratique a “ética temporal ascendente”. Este é um conceito muito interessante desenvolvido por Lourenço Stelio Rega, em seu livro Dando um jeito no jeitinho (Editora Mundo Cristão). Este princípio foi utilizado, por exemplo, pelo apóstolo Paulo, que não se posicionou claramente contra a poligamia, mas exigiu dos líderes cristãos que “fossem maridos de uma só mulher”. Naquele contexto social, a transição brusca da poligamia para a monogamia implicaria a condenação de muitas mulheres, que não possuíam quaisquer direitos legais, à miséria e à prostituição. Por isso, mesmo sendo a monogamia o ideal moral cristão, o apóstolo soube conviver com a poligamia o tempo necessário para promover a transição, de modo a evitar maiores complicações sociais.
#4 Participe dos processos de transformações sociais. A mobilização da população é o instrumento de transformação social em um estado de direito. O regime democrático implica mais do que o voto, na verdade, exige que o voto seja precedido pelo esclarecimento e sucedido pelo acompanhamento dos eleitos. A militância, geralmente associada à política partidária, deve ser encarada em seu espectro mais amplo, que inclui a sociedade civil em todas as suas dimensões de representatividade. Cumpra seu papel como cidadão. Comprometa-se com uma causa. Assuma uma postura. Associe-se com pessoas e organizações que trabalham para o bem comum. Incentive a solidariedade. Seja um doador. Faça trabalho voluntário. Divulgue boas notícias. Denuncie. Assine listas. Candidate-se. Proteste. Faça campanha. Não se omita. Faça alguma coisa. E se for o caso, chame sua turma e levante uma bandeira.

Conclusão

Geralmente se ouve que as pessoas se perguntam se vale à pena ser honesto. A profecia de Rui Barbosa se cumpriu: “De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.” Mas receio que a questão seja um pouco pior: as pessoas já não se perguntam se a honestidade vale a pena, mas sim se a honestidade é possível.
Mas não perdi a fé. Não perdi a esperança. Não deixei de acreditar na dignidade do ser humano. Aprendi que o mundo está dividido em três grupos de pessoas. Os otimistas ingênuos. Os pessimistas frustrados. E os realistas engajados. Espero somar entre os que estão de mãos arregaçadas.

Ed Rene Kivitz

www.konzept.com.br

domingo, 22 de agosto de 2010

VENHA O TEU REINO

A segunda súplica de Jesus é pela manifestação do seu reino: "Pai nosso que estás nos céus (…), venha a nós o teu reino (…), assim na terra como no céu". É a oração mais radical que um cristão pode fazer. O reino de Deus é o governo de Deus entre nós. Suplicar dizendo: "venha o teu reino" é invocar o Rei e seu governo sobre nós. Os cristãos do primeiro século entenderam a oração de Jesus e, ao suplicarem "Pai nosso, venha a nós o teu reino", todo o comportamento deles, não só pessoal, mas comunitário, foi transformado a partir desta nova realidade. Foram tomados pelo desejo de conhecer melhor a Deus e sua palavra, de viver em comunhão com os irmãos, abrindo suas casas para receber a nova comunidade do reino. Tinham profundo e sincero temor de Deus (submissão) e o poder do novo Rei se manifestava entre eles. Viviam de forma solidária suprindo as necessidades uns dos outros. Oravam, jejuavam, adoravam e, enquanto estas coisas aconteciam, o Senhor lhes acrescentava tudo o que necessitavam no dia a dia, inclusive novos convertidos (At 2:42-47). Era uma igreja que orava venha a nós o teu reino.
Justino Mártir (100-165) dizia que: "Nós, que antigamente nos alegrávamos nas relações sexuais fora do casamento, agora nos mantemos totalmente castos; usávamos a magia, mas agora nos dedicamos ao bem e ao Deus eterno; valorizávamos acima de qualquer coisa a aquisição de riquezas e bens, mas agora trazemos o que temos para um estoque comum e o repartimos com todos os necessitados; odiávamos e destruíamos uns aos outros, não convivíamos com pessoas de outras raças por causa de seus costumes diferentes, mas desde que Cristo veio, temos um relacionamento ótimo, oramos por nossos inimigos e nos esforçamos para convencer os que nos odeiam injustamente de que devem viver de acordo com os bons preceitos de Cristo, para que participem conosco da mesma esperança feliz pela recompensa do Deus que governa tudo". É um testemunho de uma igreja que também orava venha a nós o teu reino.
Nos anos 50 e 60 o mundo foi impactado pelo testemunho de um pastor batista, negro, que liderou uma das maiores revoluções pacifistas contra o racismo. Depois de receber várias ameaças de morte, numa madrugada de sábado para domingo, o Rev. Martin Luther King foi despertado por um telefonema que o deixou assustado. Levantou, foi para a cozinha de sua casa e depois de tomar um café preocupado com a segurança de sua esposa e filhos, orou assim: "Senhor, tenho estado de pé por aquilo que creio ser justo. As pessoas estão olhando para mim e pela minha liderança, se eu permanecer diante deles sem força e coragem, eles fracassarão. Estou no fim das minhas forças. Não tenho mais energia. Não tenho mais nada. Cheguei num ponto onde não consigo mais seguir sozinho". Mais tarde ele compartilhou com sua esposa: "Naquele momento experimentei a presença de Deus como nunca havia experimentado. Parecia que ouvia sua voz me dizendo: permaneça de pé pela justiça, permaneça de pé pela verdade e eu estarei ao seu lado sempre." Quando ele se levantou da mesa, estava tomado por uma nova coragem e confiança e pronto para encarar o que tinha pela frente. Ele também orou venha a nós o teu reino.
Para os judeus, a história é linear. Ela tem começo, meio e fim. É uma história que caminha para um clímax que é a intervenção de Deus na história. Quando Jesus prega o seu primeiro sermão numa sinagoga de Nazaré, ele diz: "O Espírito do Senhor Deus está sobre mim pelo que me ungiu para pregar boas novas aos quebrantados (…)". E termina afirmando: "hoje se cumpriu esta escritura". Deus interveio na história. O reino chegou. A nova ordem foi estabelecida.
Nesta oração, estamos clamando pela manifestação deste reino já presente entre nós. Não oramos dizendo leva-nos para o teu reino, mas, sim, venha o teu reino. Não somos nós que trazemos o reino, como não somos nós que tornamos o nome de Deus santo. Só Deus pode tornar seu nome santo, só Deus pode manifestar entre nós o seu reino. Esta súplica expressa nosso desejo de ver o reino de Deus presente entre nós. Vivemos entre o reino já manifestado em Cristo e o reino que será plenamente consumado quando Ele voltar. Naquele dia todas as coisas serão endireitadas, nossos olhos plenamente abertos, nossa mente totalmente transformada, nossos afetos completamente redimidos, nossa comunhão com Deus inteiramente restaurada.
Jesus inaugurou o reino. O reino de Deus é o jeito que Deus deseja que seu povo viva. É o governo de Deus sobre o seu povo. É a restauração da nova humanidade. Todo o Sermão do Monte é um retrato disto. Quando suplicamos: "venha o teu reino (…), assim na terra como no céu", oramos assim:
Pai, antecipa estas coisas. Manifesta o teu governo. Quebra todas as resistências da minha alma. Torna-me mais obediente aos teus mandamentos. Enche-me de tua compaixão. Manifeste a tua justiça entrenós. Pai, torna-me mais humilde, manso e puro para que eu viva do jeito que o Senhor Jesus, teu santo Filho, me ensinou a viver. Pai, cura a minha cegueira para que eu contemple a realidade com os mesmos olhos que Jesus, meu Rei e Senhor, contemplam.
Pai, transforma o meu medo em coragem para que eu ame a justiça e a busque como o Senhor espera que eu faça. Pai, faça de mim um instrumento de tua paz na minha família, no meu ambiente de trabalho, entre os meus vizinhos. Pai, usa-me para levantar os abatidos, socorrer os necessitados, restaurar os que tem o coração ferido, abrir os olhos dos cegos e ajudar os paralíticos a andarem.
Pai, não me deixe andar ansioso em relação ao futuro, comida, roupa, moradia e outras coisas que consomem minhas forças e energias, ajuda-me a crer que cuidas de mim e me enche de paixão pelo teu reino, pelo teu evangelho e tua justiça, certo de que as outras coisas me serão dadas.
Pai, reverte a ação do pecado. Manifeste entre nós os teus mandamentos justos e bons. Usa-nos como ministros da reconciliação. Restaure a humanidade corrompida e reine soberanamente em toda a tua criação. É uma oração que tem implicações sobre nossa conversão, nossa identidade. É uma oração que somente aqueles que entram no reino e participam dele o fazem. Somos chamados por Cristo a entrar e participar do reino de Deus. Quem faz parte do reino? O pobre e humilde de espírito, aquele que faz a vontade do Pai, aqueles cuja justiça excede a dos escribas e fariseus, aquele que se faz como uma criança.
É assim que temos orado? Quando apresentamos nossos pedidos a Deus, levamos em conta a honra do seu nome e a presença do seu reino em primeiro lugar? Quando oramos pelo emprego, salário, saúde, família, nação, orientação e direção, é para que o reino de Deus se manifeste em todas estas áreas? A oração que Jesus ensinou começa assim: "Pai nosso, santificado seja o teu nome. Venha a nós o teu reino".

Pr. Ricardo Barbosa

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

JESUS TINHA OS PIORES AMIGOS DO MUNDO

Todo homem se sente sozinho ao menos uma vez na vida. Na maioria das vezes por que percebe que mesmo estando cercado de pessoas, dificilmente conta com o apoio incondicional da amizade alheia. Então as pessoas entram em crises. E se esquecem que a figura de Cristo não foi nem um pouco agraciada com amigos excepcionais.
O problema da amizade no mundo contemporâneo é a busca da aceitação. Queremos quem nos aceite do jeito que somos. Quem compreenda o que não faz sentido. Quem veja o que só pode ser discernido mediante a fé. E se não encontrarmos amizade neste nível, desanimamos, choramos, lamentamos.
Aí você olha para os “amigos” de Jesus e se surpreende. Ele era cercado pelos homens mais incompetentes, inseguros e interesseiros da face da Terra. E no meio de seus amigos havia também um traidor. E não há coisa mais desagradável do que conviver com quem irá certamente te apunhalar pelas costas num futuro próximo.
Mas Jesus não viveu estas crises. Ele sabia quem era e qual sua vocação. Ele entendia que o relacionamento com as demais pessoas ao seu redor não podia ser estabelecido apenas segundo a conveniência. E ele tomou a única decisão lícita para quem quer viver o evangelho integralmente: dar de si mesmo sem reservas.
O problema das pessoas com o convívio em comunidade se dá principalmente pela dificuldade que temos em prestar contas de nossa vida. E isto acontece por que não temos amigos. Temos “conhecidos”. Mas não há cumplicidade nos relacionamentos. É como se as pessoas não fossem boas o suficiente para que nós possamos nos expor. E realmente elas não são. Nem elas, nem nós mesmos.
A vida em comunidade COM COMPROMISSO é parte das disciplinas espirituais indispensáveis para quem quer fazer parte da Igreja de Cristo. Não somos Igreja apenas por sermos dois ou mais. Somos Igreja quando nos submetemos voluntariamente uns aos outros e aceitamos a repreensão do outro. Somos Igreja quando caminhamos mais devagar por que o propósito do REINO é que o indivíduo renuncie a seus direitos em favor dos outros. Morremos para que a COMUNIDADE viva.
Você precisa de amigos? Reflita bem sobre isto. Um homem solitário geralmente é aquele que não se tornou bom o suficiente para se relacionar com outros. E todas as outras desculpas são apenas desculpas. E elas não serão aceitas no dia do Juízo.

Ariovaldo Ramos

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quarta-feira, 4 de agosto de 2010

UM REFÚGIO CHAMADO DEUS


Guarda-me, ó Deus, porque em ti confio. A minha alma disse ao SENHOR: Tu és o meu Senhor, a minha bondade não chega à tua presença. Mas aos santos que estão na terra, e aos ilustres em quem está todo o meu prazer. As dores se multiplicarão àqueles que fazem oferendas a outro deus; eu não oferecerei as suas libações de sangue, nem tomarei os seus nomes nos meus lábios. O SENHOR é a porção da minha herança e do meu cálice; tu sustentas a minha sorte. As linhas caem-me em lugares deliciosos: sim, coube-me uma formosa herança. Louvarei ao SENHOR que me aconselhou; até os meus rins me ensinam de noite. Tenho posto o SENHOR continuamente diante de mim; por isso que ele está à minha mão direita, nunca vacilarei. - Salmo 16:1-9
Em que sentido Deus é refúgio? Do que ele nos esconde?
Podemos usar a declaração do salmista de que Deus é seu refúgio como uma chave hermenêutica para a interpretação do salmo por inteiro. Quando me escondo em Deus, me protejo dos males que assolam a alma. Quando nos apresentamos diante de Deus em oração é como se o ‘mundo, o pecado e o diabo’ ficassem ‘do lado de fora’.
É interessante notar que Davi não pede que Deus o esconda em algum lugar ou que simplesmente o guarde ou o livre de algum mal. Ele pede que Deus o guarde Nele mesmo. “Deixe-me esconder em ti”.
O “Deus Refúgio” de Davi é tratado por muitos como um “Deus Escape”, a quem apelo apenas na hora do arrocho ou pior: como um Deus “Flanelinha” (que é aquele sujeito que ‘vigia’ os carros nos estacionamentos públicos). Para estes, Deus é aquele a quem peço que vigie meus bens, cuide de meus imóveis, me livre do ladrão, me salve do caloteiro. Para Davi, Deus não era apenas QUEM o guardava, mas o próprio LUGAR DE SEGURANÇA no qual ele era guardado.
Deus é refúgio contra o materialismo. O salmista diz: “Além de ti, não tenho outro bem”. Ora, é claro que Davi possuía bens materiais. Entretanto, quem tem Deus como refúgio, abriga-se de toda usura, cobiça e ânsia de adquirir coisas, pois tem em Deus seu maior patrimônio (v.2); seu sustento e sua herança (v.5).
Deus é refúgio contra o azar – Sorte e azar são vistos normalmente como frutos do acaso, da coincidência, do imponderável. Mas aquele que crê em Deus como refúgio tem uma sorte que não é fruto da aleatoriedade ou do acaso; mas uma sorte com fundamento – ‘Tu és o sustentáculo, o arrimo da minha sorte’ (v.5). Seu futuro é garantido.
Deus é refúgio contra a escassez - “Tu, Senhor, és a porção da minha herança”. Notável o fato de Deus como “porção” uma vez que Deus é a totalidade, é tudo. Mas na perspectiva do salmista, há porções diversas nesse mundo a serem escolhidas. A que lhe cabia era o “Senhor”. Quem escolhe uma ‘porção qualquer’ sempre fica de olho na porção do outro. Quem escolhe o Senhor como “sua porção”, de nada tem falta, de nada se ressente.
Deus é refúgio contra a solidão – E isso se dá de duas formas. Por um lado, o próprio Senhor é companhia – “Estou sempre diante da presença do Senhor. Ele está por perto e nada pode me abalar” (Good News Bible). E por outro, Deus provê a comunhão com os “fiéis da terra” - “Quão excelentes são as pessoas de fé em Deus! Meu maior prazer é estar com elas” – versão Good News Bible.
Deus é refúgio contra a ignorância – Quando não sabemos o que fazer podemos nos esconder em Deus, pois diz Davi: “Bendigo o Senhor que me aconselha e até de noite meu coração me ensina” (v.7). Quem tem Deus como refúgio, aprende até dormindo. Tem no sono, não um tormento, não um descanso do corpo apenas, mas um professor. Acorda com novas perspectivas, novos planos, nova disposição. E cientistas já comprovaram que o cérebro ‘armazena’ os conhecimentos adquiridos ao longo do dia enquanto dormimos.
Humberto Gessinger (Engenheiros do Hawaii) já dizia: "Você precisa de alguém que te dê segurança, senão você dança, senão você se cansa...". Todos nós buscamos um esconderijo em algum ou em vários momentos da vida. Quando nos apresentamos diante de Deus, dizendo como Davi: "Tu és o meu Senhor", verdadeiramente encontramos muito mais que um esconderijo passageiro. Encontramos uma fortaleza de proteção, orientação, companhia e alegria incomparável.

Pr. Alessandro Mendonça
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quinta-feira, 22 de julho de 2010

O REINO E A RIQUEZA


Quando Jesus afirmou aos discípulos que é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no Reino de Deus, Ele acabara de ter um encontro com o jovem rico (Mt. 19), que recusara vender e doar seus bens aos pobres em troca do tesouro no céu.
Seguindo o texto, no versiculo 27, Pedro pergunta: “Eis que nós deixamos tudo, e te seguimos; que receberemos?”
No versiculo 29, Jesus afirma: “E todo aquele que tiver deixado casas, ou irmãos, ou irmãs, ou pai, ou mãe, ou mulher, ou filhos, ou terras, por amor de meu nome, receberá cem vezes tanto, e herdará a vida eterna.”
Percebemos que a palavra básica nesse contexto é despojar, ou seja, privar da posse. Para alcançar o Reino de Deus devemos ser libertos de toda forma de acúmulo e excesso que nos aprisiona e impede de aprofundar no conhecimento do Senhor e caminhar na carreira cristã. No texto em questão, o obstáculo é a riqueza, os bens materiais.
O Evangelho de Mateus (cap.13) mostra o valor do Reino dos Céus. Diz que assemelha-se ao negociante, que, ao encontrar uma pérola de grande valor, vendeu tudo quanto tinha, e comprou-a. Ou como um tesouro escondido num campo, que um homem achou e escondeu; e, vai, vende tudo quanto tem, e compra aquele campo. Ainda como uma rede lançada ao mar, e que apanha todos os tipos de peixes, mas só colocam nos cestos os peixes bons; os ruins, porém, jogam fora.
Quando o Reino é encontrado, as demais coisas são necessariamente abandonadas, pois tornam-se desprezíveis diante da importância do tesouro do céu. Fica impossível conviver com a busca da riqueza material, pois o Reino de Deus é precioso e urgente para aqueles que o alcançam.
Jesus mesmo afirmou: “Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de aborrecer-se de um e amar ao outro, ou se devotará a um e desprezará ao outro. Não podeis servir a Deus e às riquezas.” (Mt. 6.24)
É por isso que é mais fácil passar um camelo no buraco da agulha. O rico, com os seus bens, possui segurança nessa vida terrena e se preocupa em manter tal garantia. Ainda não se lançou totalmente nos braços de Jesus. Falta-lhe despojar-se das riquezas, lançar fora os impedimentos de chegar ao tesouro no céu e confiar no Senhor.
Para obter o Reino é necessário renúncia, desprendimento. O verdadeiro cristão torna-se livre de toda forma de prisão que o distancia do Senhor. Jesus afirma: “Acautelai-vos e guardai-vos da avareza; porque a vida de qualquer não consiste na abundância do que possui.Mais é a vida do que o sustento, e o corpo mais do que as vestes.” (Lc. 12.15,23)
Para aqueles que tem muito, o Senhor orienta que repartam suas riquezas. Para os que não tem tanto, que busquem apenas o necessário para uma vida digna. Mais que isso impede o acesso ao Reino de Deus. São palavras de Jesus (Mt. 6.19-21): "Não ajunteis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões minam e roubam; mas ajuntai tesouros no céu... Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração."
Entendendo isso, certa vez John Wesley declarou: “Poucas coisas testam mais profundamente a espiritualidade de uma pessoa do que a maneira como ela usa o dinheiro, pois a verdadeira medida de nossa riqueza está em quanto valeríamos se perdêssemos todo nosso dinheiro. Por isso, quando tenho um pouco de dinheiro, livro-me dele tão logo seja possível, para que ele não encontre o caminho do meu coração.”

Rosane Itaborai Moreira

quarta-feira, 21 de julho de 2010

A TEORIA DA FOFOCA


Como algo tão detestável pode acontecer tão frequentemente?
Talvez a resposta seja: sutileza. Diz o sábio Salomão: “As palavras do mexeriqueiro são como doces bocados, penetram até o íntimo do homem” (Pv 18:8). Ou seja, segundo a Bíblia, a fofoca é saborosa para quem a escuta. Na tradução desse mesmo versículo segundo a NVI, o termo comparativo é “apetitosos petiscos”. E tal comparação é perfeita: ouvir uma fofoca é tão irresistível quanto comer um quitute ou um docinho atraente. E porque a fofoca não é comparada a um pernil assado ou uma pratada de feijoada? Porque comida enche e, uma vez cheio, você não come mais. Mas a fofoca é servida em pequenas porções. A fofoca é o quibezinho do mal, o cajuzinho da discórdia, o chocolate BIS da intriga. E uma vez no seu interior a fofoca não enche, pelo contrário, abre seu apetite.
Portanto, ainda que não sejamos fofoqueiros, se somos ‘consumidores de fofoca’, somos co-autores do mal. E da mesma forma que o prazer de saborear um acepipe fica explícito, a satisfação com a fofoca ouvida também. E o fofoqueiro-quitandeiro se sentirá à vontade para oferecer-nos um segundo bombozinho de trufa de jararaca.
O apóstolo Paulo faz duas vezes a mesma recomendação à Timóteo: “Evita as conversas vãs e os falatórios” (I Tm 6:20 / II Tm 2:16). Os termos originais em grego para tais vocábulos são: bebelos e kenophania. “Bêbelos” significa profano, irreligioso e ímpio; e é o mesmo termo para a palavra ‘bibelôs’ que são bugigangas ou enfeites supérfluos. Já ‘kenophania’ vem da junção dos termos ‘kenos’ (vazio) e ‘phone’ (som). Ou seja: conversa vazia e inútil, linguagem vã e estéril.
Por que fofocamos? – Certamente diremos que não gostamos de fofoca. Diremos mais: diremos que odiamos fofoca e fofoqueiros. Então, como uma raça tão odiada se perpetua, se multiplica tanto? Porque nós a alimentamos: “Sem lenha o fogo se apaga; não havendo fofoqueiro, cessa a contenda” (Pv 26.20)
Não gostamos de fofoca, mas gostamos de condenar o outro – dizemos: “Não estou fofocando. É que não aprovo o que Fulano fez de errado.”
Não gostamos de fofoca, mas gostamos de bajular e fazer ‘média’ – Pois dizemos: “Só vou te contar isso porque sou muito seu amigo, sou de confiança...”
Não gostamos de fofocar, mas gostamos de autopromoção à custa da falha dos outros – Pois dizemos: “O Fulano fez... eu não faço”
Não gostamos de fofocar, mas gostamos que se compadeçam de nós – Pois dizemos: “Você imagina só o que o Fulano fez comigo?”
Não gostamos de fofoca, mas gostamos de acirrar os ânimos – Pois dizemos: “Assim que souberem o que o Fulano fez, eu só quero é ver o circo pegar fogo!”
Não gostamos de fofoca, mas gostamos de chocar o próximo – Pois dizemos: “Você não imagina o que o Fulano disse de você...”
E por que afinal a fofoca é ruim? Por que não podemos noticiar o mal que o outro fez?
Em primeiro lugar porque não nos compete julgar. Não temos conhecimento dos fatos e corremos o sério risco de divulgar algo que não ocorreu exatamente da forma como relatamos.
Em segundo lugar, a fofoca nunca edifica. Nunca promove o bem estar de quem ouve. Você já viu alguém ouvir uma fofoca e bradar: Graças a Deus! Ouviu?
A fofoca revela intimidades, segredos e confidências e a Bíblia diz: “O que anda mexericando descobre o segredo, mas o fiel de espírito o encobre” (Pv 11:13).
A fofoca é injusta. Expõe o outro sem que lhe seja dado o direito de se defender.
A fofoca promove separação e discórdia – “O que encobre a transgressão promove o amor, mas o que renova a questão separa os maiores amigos” (Pv 17:9)
O fim da fofoca é simples. Não existe auto-fofoca. O fofoqueiro precisa de alguém que lhe dê ouvidos. É extremamente difícil calar um fofoqueiro uma vez que ele iniciou a conversa. Então evite o fofoqueiro. Aprenda a identificá-lo:
Características do fofoqueiro
- quer se mostrar seu amigo (íntimo). Chega dando tapinhas nas costas e te pegando pelo braço - “Vem cá que tenho que te contar uma coisa...”
- quer se mostrar seu defensor, alertando-o – “Olha, só te conto porque quero o seu bem...”
- fala demasiadamente, o tempo todo, de tudo e de todos.
- toma conclusões precipitadas – Você nunca ouvirá um fofoqueiro dizer que é melhor apurar melhor os fatos. Pelo contrário, sua máxima é: “Eu já sabia. Eu sempre soube. Nunca me enganei com Fulano...”
- abre espaço para a crítica elogiando primeiro – “Não tenho nada contra o Fulano, mas...” ou “Gosto muito de Sicrano, só que...”
Diante do fofoqueiro, o antídoto é certo: elogie o ‘fofocado’, defenda-o e convide o fofoqueiro a orar por ele e a perdoá-lo. Pois é exatamente esse tratamento que recebemos de Jesus quando pecamos. Ele intercede por nós, nos defende e nos perdoa. Por isso que ninguém gosta de contar fofoca pra Ele.

Pr. Alessandro Mendonça
www.gostodeler.com.br

domingo, 18 de julho de 2010

PARÁBOLA DO CRISTÃO RICO E DO SEM-TERRA HONESTO


Dois homens foram certa vez à mesma igreja: um, cristão, e o outro, sem-terra. O cristão, posto em pé, orava consigo mesmo, desta forma: “Ó, Deus, graças te dou porque não sou como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros, nem ainda como este comunista. Venho à igreja duas vezes por domingo e dou para a obra a décima parte do meu líquido, que é maior que o bruto acumulado de todos os meus empregados”. O sem-terra, estando em pé, longe, e que havia entrado na igreja para ver se seria recebido com alguma misericórdia, não ousava nem ainda levantar os olhos ao céu, mas batia no peito, lamentando que suas maiores suspeitas fossem justificadas. O cristão voltou para casa sentindo-se justificado; o sem-terra não voltou para casa porque não a tinha.
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– Explique-nos esta parábola.
– Vocês não entendem esta parábola? Como, então, entenderão todas as parábolas?
– Seja mais claro.
– Esta é uma parábola sobre coisas que não existem.
– Então Deus não existe? Temos estado enganados todo este tempo?
– Néscios! É claro que Deus existe. O que não existe é sem-terra honesto.
– Oohhh!
– Nem cristão rico.

Paulo Brabo
www.baciadasalmas.com